O que levaria um homem de 52 anos a atravessar, a pé e sozinho, boa parte do litoral nordestino? O chileno Ricardo Brambilla, que percorreu mais de 1.100 km em 63 dias, explica. “Eu queria me aventurar, viver um desafio e superar meus limites. Sempre gostei de praia e já praticava trekking [espécie de longa caminhada, comumente realizada em montanhas], então uni o útil ao agradável”, disse.
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Ricardo Brambilla percorreu cerca de 20 Km por dia na estrada
Natural de Santiago e morador de Natal há 20 anos, Ricardo Brambilla andou da Praia de Cotovelo, em Parnamirim, até a Basílica Santuário Senhor do Bonfim, em Salvador, numa viagem planejada durante oito meses. O andarilho estudou todo o percurso com antecedência, analisando os custos e calculando as distâncias. Ele percorria cerca de 20 km por dia, o que equivale a sete horas diárias de caminhada. A façanha teve início no dia 2 de dezembro, chegando ao fim em 2 de fevereiro.
O chileno carregava 25 kg em sua mochila, que continha barraca, saco de dormir, mantimentos, fogareiro, algumas poucas peças de roupa, remédios, material de higiene, lanterna, carregador solar, bússola e cantis de água, além de tablet e máquina fotográfica, para registrar a aventura. “Antes de partir, investi cerca de R$ 1.800 em equipamentos que não possuía, como o tablet e a câmera. Ao longo do percurso, gastei mais uns R$ 4.000 em comida, água mineral e nas dormidas em ‘quartinhos’ que custavam de 30 a 40 reais por noite. Dormi uns 70% dos 63 dias de viagem dessa forma. O restante foi do jeito que conseguisse. Dormi na areia da praia, em sacadas, num barco de pesca, em cima de uma árvore e até mesmo num galinheiro. Na Ilha de Itamaracá, em Pernambuco, passei por uma situação complicada. Coloquei a barraca na praia e a maré subiu. Naquela escuridão, não sabia o que fazer. Acabei dormindo em cima de uma mesa, rodeado por água. É difícil caminhar após uma noite mal dormida”, relatou.
Os maus bocados pelos quais Brambilla passou vão além das condições de sono. “Costumo dizer que não comia, apenas me nutria. Tinha cuidado com minha alimentação, mas fazia somente uma refeição reforçada por dia. Nela, comia geralmente algo típico dos brasileiros, como feijão, arroz, cuscuz, macaxeira, batata e inhame. Eu não como carne, mas sempre que encontrava peixe, comia. Ao longo do dia, tomava muita água e comia muitas frutas, em especial, banana e laranja”, contou.
Mas a peripécia do chileno também reservou bons momentos. “Passei por vários lugares em que gostei tanto que pensei ‘não quero mais sair daqui’, mas criei um carinho especial por Porto de Pedras, em Alagoas. Não só pela beleza do local, mas pelo acolhimento que recebi. Focado no meu desafio, nem reparei que já era virada do ano. Uma família bem humilde me recebeu de braços abertos e tornou aquele réveillon inesquecível”, revelou.
Ricardo sempre praticou esportes, mas reforçou sua preparação física nos 70 dias que antecederam a viagem, contratando uma personal trainer para treinos funcionais na areia. Ele voltou da capital baiana de ônibus e está organizando um documentário em vídeo sobre sua aventura. Pensa em viver outra experiência parecida, caso tenha patrocínios e uma melhor estrutura, mas, por ora, quer descansar. “Durante o percurso, utilizei apenas um par de botas, específicas para a prática de trekking. Elas rasgaram por duas vezes, em Alagoas e Sergipe, passaram por ‘pontes de safena’ mas agora estão inutilizáveis. No momento, quero repousar. Não vou nem pra padaria a pé mais”, brinca.
Da: Tribuna do Norte.