segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Agredido após assalto, jovem refaz 3º ano e foca nos preparativos do Enem.

  Léo Lira foi vítima de espancamento e ficou inconsciente por três meses.

 Apoio da família e de amigos tornou o sonho da universidade possível.


Após seis meses internado em estado grave, Léo voltou à escola e se prepara para o Enem. (Foto: Anna Tiago/G1)Após seis meses internado em estado grave, Léo voltou à escola e se prepara para o Enem. (Foto: Anna Tiago/G1)
“Foi só um ano da minha vida que perdi, tenho condições de voltar.” É assim que o estudante Leonardo Lira, de 19 anos, definiu sua volta aos estudos para se preparar para as provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), nos dias 8 e 9 de novembro. Léo, como é chamado pelos parentes e amigos, esteve internado de fevereiro a agosto de 2013 e foi afastado do último ano escolar após ser espancado durante um assalto em Itamaracá, na Região Metropolitana do Recife (RMR).
"Ele é considerado por muitos um milagre", diz Sandra, mãe de Léo. (Foto: Anna Tiago/G1)
"Ele é considerado por muitos um milagre", diz
Sandra, mãe de Léo. (Foto: Anna Tiago/G1)

Na época com 17 anos, o jovem sofreu traumatismo cranioencefálico. Até maio do ano passado, ele estava inconsciente: não andava, não falava, não enxergava, se alimentava por uma sonda e respirava por meio de traqueostomia. Para alguns médicos, era um caso sem volta.  “No primeiro diagnóstico, o neurologista disse que ele tinha 10% de chance de sobreviver, pois tinha faltado oxigênio no cérebro”, lembra Sandra Lira, mãe de Léo.
Após três meses desacordado, ele apresentou uma melhora que surpreendeu a todos, foi liberado do hospital e passou a ficar internado em casa. Em julho, com a ajuda de tratamentos intensivos acompanhados de fisioterapeutas e fonoaudiólogos, Léo já ficava de pé e reaprendeu a engolir. Em agosto, ele teve alta de todos os medicamentos - o jovem chegou a tomar 22 comprimidos por dia. “Foi uma história que, até maio, até eu achava que ele ia continuar do mesmo jeito. Ele é considerado por muitos um milagre, porque a recuperação dele foi muito grande e o tempo dessa recuperação foi curto”, diz a mãe.
Tem coisas que ele tem que aprender e reaprender junto com a escola e com os professores. Dentro da limitação que ele apresenta e vem quebrando, eu considero um aluno como qualquer outro. Sabemos que ele tem certa dificuldade, mas o tratamento que damos é igual. Para a escola, a história dele foi um aprendizado"
Alfredo Matos, diretor do
Colégio de Aplicação da UFPE

No início deste ano, mais um desafio: refazer o terceiro ano e voltar a se preparar para o Enem. “Eu perdi minha turma, com quem estudei da quinta série até o segundo ano. Tive que, do nada, dar tchau para eles”, lamenta. De acordo com a mãe, foi difícil para ele aceitar. “Acho que foi a parte mais complicada. Quando ele se conscientizou foi que começou a se movimentar mais para estudar”, revela. Mas Léo não teve problemas com a nova turma, que o recebeu de braços O estudante, que pretende cursar engenharia civil, voltou ao Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Pernambuco, onde estuda desde a quinta série, em outubro de 2013. “Eu já tinha perdido praticamente o ano todo. Estava tentando acompanhar as aulas, mas já era final do ano, estava sem esperanças. Não sabia de nada do terceiro ano e, para o Enem, não ia mudar muita coisa”, lembra Léo. Mesmo depois de um ano complicado, ele fez as provas em regime especial, acompanhado por uma fisioterapeuta e uma enfermeira. “Ele ainda estava com um desvio ocular, estava vendo duas provas. Até conseguiu ter uma média boa, mas perdeu todo o assunto do terceiro ano e teve muita dificuldade”, conta Sandra.abertos. “A gente já sabia da história dele pelas redes sociais e ficamos amigos logo. Ele se entrosou muito bem com a turma”, diz Luís Filipe Harten, colega de sala.
Hoje, o estudante divide o dia entre aulas, pilates, fisioterapia e musculação. No início do ano, além de frequentar a escola, fazia um curso preparatório, mas, nessa reta final, só estuda em casa. “Eu estudo muito na internet porque tenho facilidade de aprender assistindo videoaulas.
Praticamente não leio nada, só vejo vídeos”, conta. Animado, Léo prefere não lembrar do período em que esteve internado e se vê na universidade no próximo ano. “Teve um tempo que eu não tinha esperanças para nada, mas agora estou com fé”, afirma.

Matemática
O garoto que montava um cubo mágico em dois minutos não escolheu o curso de engenharia à toa: sempre teve facilidade com matemática e raciocínio lógico. Hoje, leva um pouco mais de tempo para separar as cores do cubo ou fazer cálculos, mas o bom desempenho na disciplina continua mesmo após tantos transtornos. “Quando ele fez a seleção para entrar na escola em que estuda, passou em sexto lugar porque acertou todas as questões da prova de matemática. Hoje, ele continua sendo bom na matéria”, orgulha-se a mãe.

“Gosto mais de matemática e gosto menos de história, geografia, todas as matérias que não tem cálculos”, ri Léo. O gosto pelas ciências exatas se comprova nas aulas. “Algo que é interessante é o fato de ele mostrar que também estuda muito fora da sala de aula. Às vezes, a gente está trabalhando um assunto e ele pergunta 'professor, posso resolver dessa maneira? Eu vi num vídeo na internet ensinando desse jeito, eu acho mais fácil'”, conta Tarcísio Rocha, professor de matemática.
Devido aos problemas de saúde do ano passado, o estudante tem um pouco de dificuldade para se concentrar, mas não se envergonha em tirar dúvidas quando necessário. “É bem comum ele vir, ao final da aula, perguntar algo que não entendeu. Ele mostra muito empenho”, diz o docente.
Para Alfredo Matos, diretor da escola, Léo vem superando os próprios limites e é considerado um aluno normal. “Tem coisas que ele tem que aprender e reaprender junto com a escola e com os professores. Dentro da limitação que ele apresenta e vem quebrando, eu considero um aluno como qualquer outro. Sabemos que ele tem certa dificuldade, mas o tratamento que damos é igual. Para a escola, a história dele foi um aprendizado”, diz.
Campanha "Diga sim ao Léo" ganhou muitos adeptos nas redes sociais. (Foto: Divulgação)
Campanha "Diga sim ao Léo" ganhou muitos adeptos nas
redes sociais. (Foto: Sandra Lira / Acervo pessoal)

Apoio
O retorno de Léo à vida e aos estudos só foi possível graças ao apoio que a família teve de amigos e até de desconhecidos no período em que o garoto esteve internado. “Enquanto ele estava hospitalizado, o plano de saúde estava cobrindo. Quando foi transferido para a residência, os custos chegavam a R$ 10 mil por mês, muito acima da receita da casa. Aí começaram as campanhas para ajudar no tratamento dele”, conta a mãe.

Desde fevereiro de 2013, camisas e rifas são vendidas para ajudar Léo, inclusive na própria escola. Em abril, alunos do Colégio de Aplicação organizaram uma festa, revertendo toda a renda da venda dos ingressos e das comidas e bebidas para a família. A mobilização nas redes sociais sensibilizou milhares de pessoas, que ajudaram na causa, inclusive jogadores do Sport Club do Recife, que doaram camisas do time.
Em agosto, forrozeiros pernambucanos fizeram o Grande Encontro do Forró, no Teatro Santa Isabel. O show solidário contou com Nena Queiroga, Petrúcio Amorim, Nádia Maia, Cezzinha, Nena Queiroga e Rogério Rangel. O cachê dos artistas também foi doado.
O carinho dos amigos foi fundamental na recuperação de Léo. Quando retornou à escola, todos os colegas de turma vestiram a camiseta da campanha. “Na foto oficial do terceiro ano, ele era o único que não estava. Como ele não podia sair, toda turma foi para minha casa e tirou a foto com ele”, lembra a mãe.

Amigos da escola foram à casa do jovem, impossibilitado de andar, para fazer a foto oficial da turma. (Foto: Divulgação)

Amigos da escola foram à casa do jovem, impossibilitado de andar, para fazer a foto oficial da turma. (Foto: Sandra Lira / Acervo pessoal)

 Do: G1/PE.

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